sexta-feira, 9 de março de 2012

Tribunal do ex-amor

Já pensou se todas se reunissem para falar de mim? Um salão circular preenchido por cadeiras confortáveis, um tribunal onde eu seria acusado pelo crime que vivo cometendo: ser eu mesmo. Todas as ex-namoradas, ficantes, paixonites e afins juntas, debatendo meus prós e contras, meus erros e acertos. A paixão da 2ª série sentada ao lado da atual dona dos meus pensamentos soturnos e noturnos. A esquisita frente a frente com a mais cheirosa. A inesquecível trocando telefone com a mais efêmera.

De fato, seria curioso. A primeira namorada se aproximaria do púlpito localizado no centro da sala e abriria o verbo contando como nos conhecemos e como nos desconhecemos. Falaria das noites, dos beijos e do meu descontentamento com suas alegrias. Pertinentemente, começaria a lembrar de que até poderíamos ter ido mais longe, mas voltaria a me odiar porque só tivemos 1 semana para terminar o que nem começamos direito. E eu sem direito de me defender.

Todas falariam das mensagens de texto no celular. Palavras carinhosas (parte I), carinhosas (parte II) e sumiço temporário que durava um bom tempo. Ou mais. Nesse intervalo, discutiriam por que sou assim. Diriam que é o cansaço, preguiça, displicência, impaciência e inúmeros motivos tortos. Diriam também que no começo é tudo maravilhoso, mas que no fim eu simplesmente deixava pra lá. Reclamariam que os apelidos fofos só apareciam depois das brigas e até que as próprias mensagens só surgiriam de novo após as brigas. Algumas mais radicais e recentes informariam sobre a mania cruel de mensagens de madrugada carregadas de teor alcoólico. Tendência unânime: todas elas adoravam receber as mensagens, mesmo as forçadas.

Algumas falariam pouco, outras elogiariam, mas sempre com uma queixa a fazer. Saídas que não aconteceram, beijos que não rolaram ou que ocorreram tarde demais, verdades inescapáveis, terríveis acessos de fúria em salas de cinema, coisas. Ninguém sairia satisfeito até dizer o que havia entalado na garganta para alguém que também tinha algo a dizer. No entanto, ao ouvirem o barulho e afirmações fortes que cada uma fazia, perceberiam uma coisa: eu tinha sido melhor para as sucessoras. A número 1 serviu de teste e aperfeiçoamento para a relação com a número 2 e assim por diante. Nenhuma tinha uma reclamação exatamente igual. “As pessoas mudam”, diria alguma das presentes que pensasse nisso.

Nenhuma foi tratada pelo mesmo adjetivo da outra, sempre houve reinvenção. Nenhuma conheceu os mesmos defeitos que a antecessora conheceu. Ou eles ficaram mais evidentes ou se perderam no tempo. Por fim, todas admirariam o cuidado que tive para não enxergar as mesmas pessoas em corpos diferentes. Algumas derramariam uma lágrima por ainda estarem procurando alguém como eu, outras simplesmente sairiam do local reconhecendo minha inocência e as mais orgulhosas e céticas ainda iriam querer mais debate e discussão.

Neste dia, iriam para a casa com a única certeza sobre os humanos que existe: ninguém é igual. Nem mesmo a mesma pessoa é exatamente igual aos 13 e aos 20 anos. Sofreriam por saber que eu segui em frente e seguiriam em frente ao saber que eu também sofri para chegar aqui. Um tribunal sem sentença, onde a única juíza é a vida e onde o único réu é você mesmo.

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Um comentário:

  1. Não seria sincera se não admitisse que me diverti um bocado com esse seu texto. E, sabe, são desses que eu mais gosto. É quando você se expõe e deixa sua alma despida para quem quiser ver... É nesse momento que sua verdade cativa e você ser torna escritor. Vale muito a pena se prender nas suas palavras quando ela se prendem na gente.
    Beijos.

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