quinta-feira, 21 de novembro de 2013

Mindfuck

Mesa de bar. 22:13. Em meio ao vozerio intenso dos frequentadores do lugar, me pego observando despretensiosamente cada corpo estranho ao meu redor. A loira da mesa ao lado esboça um sorriso extremamente sensual enquanto gesticula com as prováveis amigas de faculdade. A negra, de corpo escultural, amarra o cabelo encaracolado de forma cuidadosa, destacando ainda mais sua beleza nativa. A japonesa de traços delgados mexe no celular, comenta sobre o cabelo da amiga negra e sorri para a moça loira, ao mesmo tempo em que se delicia com o clichê do sushi.

O chopp é dobrado. E também é dobrada a vontade de me embriagar. Pouco importa se é segunda-feira, se amanhã cedo o trânsito é um inferno e se tenho faculdade às 7:30. Sempre fui intenso, ávido pelo presente e desconfiado do futuro, esse completo desconhecido que desespera e anestesia tanta gente todo santo dia. Na verdade, nunca enxerguei nada além do tempo que preciso para sobreviver. E ele nunca ultrapassou as 24 horas daquela série americana. Vivo, erro, aprendo, sofro, me alegro... presente.

Do outro lado do bar, uma guria começa a me encarar. Olhares perdidos e encontrados em um mesmo compasso, de maneira que a cadência de seus olhos azuis de cigana oblíqua, dissimulada e gostosa acaba por penetrar em meu olhar vazio e arredio. Nunca antes na história dessa minha vida... Em mais de 1 hora nessa troca de olhares, não me passa pela cabeça fazer absolutamente nada. Nenhum bilhete entregue a ela via garçom, nenhum comentário tipicamente masculino com os amigos da mesa e nenhuma esperança, uma vez que seu namorado é extremamente mais forte e mais simpático que esse que vos escreve.

Ele levanta. 1 minuto depois, ela vem em minha direção. Em uma conversa meio sem sentido, diz que sente minha falta, pergunta pelos meus pais e se Spike ainda está vivo. Quem é Spike? Aliás, Spike sempre foi o nome que eu daria a um cachorro. Se eu tivesse um. Depois de uns 678 chopps, dobro minha consciência e tento me lembrar de onde conheço aquela maluca extremamente bonita que agora desafia meu senso mental. Ela me dá um beijo, pergunta se ainda moro no mesmo lugar e promete uma visita "qualquer hora dessas". Bianca.

Bianca namorou comigo 2 anos e 7 meses depois disso. Jura não se lembrar de ter me visto em bar algum naquele dia. Jura de pés juntos não saber quem era o cara malhado que descrevo incansavelmente. Nunca mais vi a loira, a negra, muito menos a japonesa. Faço análise com um psicólogo maluco desde que Bianca começou a namorar com o cara do meu retrato falado. Parei de beber.

O futuro tem dessas coisas. A gente nunca sabe se ele já não está presente!