terça-feira, 25 de maio de 2010

Porções de domingo

Eu vejo tudo enquadrado – e nem tenho um remoto controle. Não dá pra pausar os melhores momentos, avançar as dificuldades ou gravar toda minha vida para a posteridade. Não tenho status, não tenho como, vivo de carona. Pela janela do carro, vejo uma tela. Triste, porém real. Pessoas passam, fatos passam, o passado passa… e o presente continua nos dando presentes cheios de incerteza, cheios de dúvida, cheios de verdade. E como essa verdade dói.

Domingos. Se eu tivesse um carro, juro que sairia todo domingo de manhãzinha, só pra aproveitar aquele cheiro de novidade de mais um dia. Mas domingo não é um dia como outro qualquer. Também não é um dia como sábado, que, particularmente, é meu preferido. Domingo é mais tranquilo, é mais família, é mais vermelho. Ainda me pergunto de quem é a culpa pelo moulin rouge nos domingos “calendarianos”. Deve ser coisa da Igreja, que ainda insiste em guardar os domingos. E por que guardar algo que nos pode ser tão útil?

Era domingo quando vi a tristeza em seu olhar. Uma garota, mais ou menos 15 anos. Vestido longo, sandália rasteira, lágrimas reluzindo em um rosto desacostumado a sofrer. Uma mãe. Consolava aquela menina que aparentava ser forte, apesar de tudo. Ela também sofria, era visível. Assim como era visível o que acontecera, mas que até hoje não sei se é apenas pensamento de jovem poeta. Seu pai não estava mais ali. Ela sentia medo, muito medo. Foi à igreja, perto do mar, manhã de domingo, chorar um pouco, lembrar um pouco, aprender a viver e reviver tudo de novo.

Fez-se domingo quando mais nada era interessante. Quando voltar ao lugar com mar, igreja e tristeza era só mais um querer. Desejar encontrar a jovem e perguntar o que acontecera, por que chorara tanto e como estava sua vida a partir de agora. Mas não. Viagem de volta. E as imagens do domingo comum invadem meus olhos, refletem em minh’alma, me fazem melhor – ou pior. Pessoas voltando da casa de Deus, com uma crença diferente da minha. Crianças diferentes de mim, correndo pela rua, em meio a um sol escaldante. Gente simples, fazendo coisas simples. Gente sofrida, vivendo uma vida sofrida. E eu nada posso fazer. Ou será que posso? Observar?

Era nosso domingo. Domingo de Páscoa. Hora da ressureição. Conheci o gigantismo das máquinas, o lado, até então, desconhecido de uma cidade, o verde fechado, o longe benevolente do preconceito, a vontade de fazer a diferença e reconheci o poder dos domingos. Ao lado de uma parte, agora, fundamental pra mim. Que me perdoem os outros domingos, mas esse vai ficar marcado. Na memória e agora, em forma de pedaços de prosa e poesia.

O melhor amor em vermelho que já conheci na vida